*Por César Costa, Head de Inovação na Semente Negócios
Mesmo muito antes do surgimento de metodologias como Design Thinking, Lean Startup, Business Model Canvas, Customer Development, entre outras utilizadas em processos de inovação, diversos autores vêm propondo que organizações devem ter habilidade para gerenciar a eficiência e o crescimento do negócio atual (Exploit) ao mesmo tempo que é criativa e adaptável para explorar novas oportunidades para continuar relevante no longo prazo (Explore).
Esta ambidestria organizacional, termo cunhado por Robert Duncan em 1976, foi explicado de forma didática em 2004 por Charles O’Reilly III e Michael Tushman. Mas, basicamente, enquanto o alinhamento Exploit segue um pensamento mais antigo, com foco somente no lucro de uma empresa, o Explore tem a inovação e o crescimento como estratégias, por exemplo, entre tantos outros diferenciais.
O conceito é tão fácil de entender quanto é de explicar.
Por que então, depois de quase meio século, continua sendo tão desafiador ser uma organização ambidestra?
Perceba quão paradoxais são as características necessárias para a ambidestria. Em uma organização tradicional, em que o Exploit domina as suas decisões, é quase insensato investir em inovações de alto risco (incerteza) e de resultados mais longevos – as chamadas inovações adjacentes e transformacionais. Isso porque elas normalmente competem pelo mesmo orçamento de inovações incrementais, em que o retorno sobre o investimento é mais assertivo e de menor risco, além do resultado ser de curto prazo.
Ou seja, a mentalidade vigente da maior parte das organizações não ambidestras leva a liderança para investimentos em inovação incremental. Isso obstrui sua visão perante cenários de longo prazo, e possivelmente a leva a continuar fabricando carroças em mundo movido a automóveis, e câmeras analógicas em mundo digital…
Como trabalhar o presente e o futuro
Para que consigam desenvolver a habilidade de trabalhar o presente e o futuro lidando com todos os seus antagonismos, diversas organizações têm investido em estruturas como os Centros de Inovação. Essa estrutura normalmente funciona como um ‘prestador de serviços de inovação’ para a empresa-mãe, tendo maior autonomia para inovação e focando em inovações adjacentes e transformacionais, além de ser uma ponte entre a organização e o ecossistema de inovação. No Brasil, temos exemplos fantásticos, como o Brain da Algar, o Onono da Basf, a recente Conexo do Grupo Randon, parceira da Semente, e muitos outros.
Os Centros de Inovação ajudam organizações por darem maior autonomia para os projetos de inovação, por possuírem orçamento específico para projetos não incrementais e times focados em trabalhar olhando para o futuro com metodologias adequadas para isso, protegendo-se de detratores existentes na empresa. Além disso, já possuem a premissa de trabalhar em contexto de incertezas, portanto há maior propensão ao risco e uma cultura de experimentação.
Mesmo assim, cerca de 80 a 90% dos Centros de inovação falham e acabam representando apenas desperdício de recursos (tanto financeiros como humanos) para as organizações, de acordo com uma pesquisa realizada pela consultoria Capgemini em 2018. Assim, baseando-se nas nossas experiências, pesquisas e benchmarkings nacionais e internacionais, chegamos a algumas boas práticas que podem contribuir para a mitigação dos riscos envolvidos em um projeto como esse.
- Definir a ambição e os objetivos estratégicos do Centro de Inovação;
- Implementar uma governança própria e ligada diretamente à alta administração, ou até mesmo ao conselho;
- Estabelecer um orçamento específico para o Centro, não dependendo da empresa-mãe para obter recursos a cada nova iniciativa;
- Criar um portfólio de iniciativas e programas bem definidos e alinhados à estratégia;
- Trabalhar com equipes enxutas, autônomas, diversas e multidisciplinares;
- Manter-se constantemente conectado ao ecossistema de inovação.
Como forma de mitigar estes riscos, publicamos um guia sobre a metodologia para desenvolvimento de Centros de Inovação da Semente. São abordados três grandes blocos em sua construção: estratégia, governança e operação.
Organizações que buscam essa estrutura podem solucionar alguns dos problemas relacionados às características paradoxais da ambidestria ao trabalhar em conjunto os pilares essenciais para sustentação e longevidade dos Centros de Inovação corporativos, focando numa visão transformacional, mas ao mesmo tempo buscando trabalhar a cultura de inovação de maneira transversal na empresa.
*César Costa – Sócio e head de inovação corporativa da Semente Negócios, empresa que atua em projetos para impulsionar startups e negócios sociais, alavancar o desenvolvimento territorial através do empreendedorismo inovador e aumentar as competências de inovação em organizações estabelecidas. Administrador pela UFRGS, Mestre em Inovação, Tecnologia e Sustentabilidade pelo PPGA/UFRGS, estudou management na Lund University, na Suécia e Strategic Management & International Business na University of La Verne, nos EUA. É Coach Profissional e Analista Comportamental formado pelo Instituto Brasileiro de Coaching e mentor no InovAtiva Brasil. Já desenvolveu projetos de inovação em diversas empresas, como Natura, NSC, Cianet, Mercur, Senac, BB Seguridade, Hospital Moinhos de Vento, entre outros. Desenhou a metodologia Corporate-up.